Sporting: São João de mãos dadas com o filho do ‘seu Bicudo’

São João da Boa Vista – A cidade onde Matheus Reis nasceu não larga a mão do defesa do Sporting, um dos mais ilustres filhos da terra. Em São João, a 218 quilómetros da metrópole São Paulo, mas a dois passos do estado vizinho de Minas Gerais, ninguém quer ouvir falar do Benfica, de Belotti e muito menos de pisadelas. O filho do seu Bicudo, carismático pai do jogador, tem «boa índole e bom caráter», «é humilde», e «jamais, desde os seis anos de idade, foi maldoso em campo ou fora dele».
«Era até uma moça, como se costuma dizer aqui, em campo», garante André Franco, o primeiro treinador do defesa.
Tal como o pioneiro luso-brasileiro Antônio Machado invadiu a região há exatos 200 anos, A BOLA também entrou em São João, com 93 mil habitantes, sem pedir licença: ouviu o seu Bicudo em pessoa, antes da família Reis de Lima se evaporar da cidade, e conversou com vizinhos, amigos e treinadores de Matheus, o antigo médio ofensivo do clube formador local Centro Social Urbano (CSU), hoje defesa bicampeão nacional e vencedor da Taça de Portugal, numa final em que se envolveu num lance controverso com Belotti, na final no Jamor, com o Benfica.
«Não sei de nada disso», começou por dizer Paulo Lima, ou seu Bicudo, como todos o chamam na cidade, incluindo na Beraldo Autopeças, a empresa onde trabalha a retificar motores.
«Vi o jogo e só sei que o futebol é desse jeito, também joguei e sei como é», acrescentou, antes da chamada telefónica cair e não mais atender o telemóvel.
No dia seguinte, a nora, Jack Rodrigues, que está grávida do segundo filho de Matheus Reis, denunciou as ameaças que recebeu nas redes sociais.
DE ADMIRADOR A… FAMILIAR
São os amigos, portanto, que tomam a palavra. «Eu e a minha família somos amigos do Bicudo e da Luciana [mãe de Matheus Reis] desde sempre. E o moleque já desde os oito anos que se destacava muito no futebol, ainda era sub-9 e já jogava nos sub-12, como meia esquerda, tinha um estilo clássico, de qualidade», recordou Edenilson, funcionário do CSU.
«Ah, lembrei-me de uma coisa. Ele e um sobrinho meu, o Bruno, despertaram a atenção do São Paulo, o Matheus foi, mas o Bruno saiu para o Paulista de Jundiaí, com quem o CSU mantinha um protocolo, eles ainda são muito próximos hoje em dia», atirou.
E onde se pode encontrar o Bruno então, pergunta A BOLA? «Lá no centro, num bar que inaugurou ontem.» Edenilson acertou em cheio, lá estava ele. «Sim, sou o Bruno. Conheço o Matheus desde os sete anos, jogávamos na mesma escolinha aqui, depois fui para outra escola, a jogar na posição dele, meia esquerda, no mesmo jogo, um contra o outro, acabei indo para o Paulista e ele para o São Paulo, o resto você sabe», começou por contar.
Instado a falar sobre as capacidades que já na altura o lateral leonino mostrava, Bruno, 31 anos, mais um do que Matheus Reis, foi certeiro: «Ele tinha uma qualidade diferente. Era muito esforçado e gostava muito de ganhar, mas sempre mantendo uma índole muito boa, pode percorrer a cidade de São João da Boa Vista toda que não ouvirá ninguém dizer algo diferente do que estou a dizer, nem dele, nem do seu Bicudo, nem de ninguém da família, a humildade deles é uma das grandes qualidades que têm.»
O dono do já referido bar recém inaugurado, Lucas Manso, não só conhece Matheus Reis como é casado com a prima de Jack, mulher do lateral leonino: «Sempre o admirei desde moleque e agora sou familiar dele [risos]. Ele reúne-se sempre connosco, este ano mais ainda graças à dobradinha, não é? Infelizmente houve ameaças a ele, à Jack e ao filho Teteu.»
Antes, já Edenilson, funcionário do CSU, havia falado sobre o lance polémico no Jamor: «Vi os vídeo das ameaças, não posso deixar de ficar indignado com esses ataques, o Matheus é competitivo, mas jamais foi maldoso», acrescentando logo de seguida: «Ele aqui nunca teve algum episódio de agressão ou de violência ou um lance mal intencionado. Usa muito a força física porque sempre foi uma característica dele, mas jamais com maldade, quem conhece o futebol entende que é um lance fortuito e que querem fazer dele um bode expiatório para uma derrota, é assim no Brasil também.»
MARCAVA MUITOS GOLOS
E A BOLA foi desafiada: «Mas, fale com o André, primeiro treinador dele.» Frente a frente com André Franco, 53 anos, no outro lado da cidade, A BOLA ouviu o técnico.
«Treinei-o dos seis aos catorze anos, quando ele foi para o alojamento do São Paulo, na minha escolinha jogava sempre de meia ou de segundo volante [médio ofensivo] porque ele aliava habilidade e força na marcação, até dizíamos ‘se a bola passa pelo Matheus sofremos golo de certeza’, era o menino mais forte fisicamente que tínhamos e fazia muitos golos porque quando pisava na área marcava e, às vezes, também marcava de fora da área», revelou.
Questionado sobre a polémica em torno do jogador do Sporting, Franco foi taxativo: «Maldoso? O Matheus sempre foi tranquilo, nada agressivo, aliás, ele é que apanhava, os rivais colocavam sempre um marcando e um a sobrar, quando ele passava os dois, eles já o caçavam e ele nunca foi de querer reagir, era quase uma moça dentro de campo, como se diz aqui.»
Eduardo Correia, funcionário público e narrador de futebol na rádio Jovem Pan nas horas vagas, complementou as palavras do treinador: «O Matheus é um orgulho sanjoanense, a cidade acompanha a carreira dele, primeiro no São Paulo, depois no Bahia, depois no Rio Ave e agora a ganhar muitos títulos no Sporting. E é um orgulho também pelo comportamento em campo e fora dele.»
À saída de São João da Boa Vista A BOLA pode garantir que ninguém larga mesmo a mão do filho do seu Bicudo.